José Bezerra Gomes
112 anos do natalício do poeta e romancista seridoense
Nascido em 08 de março de 1911, José Bezerra Gomes foi um eminente escritor e intelectual currais-novense, a mais alta expressão da Literatura seridoense no cenário literário potiguar, ao lado de grandes vultos como Auta de Souza, Zila Mamede, Câmara Cascudo entre outros tendo ainda se sobressaído nacionalmente durante a década de trinta. Nasceu no sítio Brejuí, sendo filho de Napoleão Bezerra de Araújo Galvão com dona Veneranda Bezerra de Melo e neto do famigerado político Cel. José Bezerra de Araújo Galvão (Vulgo: Coronel Zé Bezerra). Escritor, poeta, romancista; advogado, político, pesquisador e ensaísta obteve as primeiras letras ainda pequeno na casa grande da fazenda Aba da Serra com uma tia e o famoso Prof. Francisco Rosa (vulgo: Chico Rosa). Em 1918 aos seis anos de idade iniciou os estudos formais no Grupo Escolar Capitão-Mor Galvão em Currais Novos-RN onde concluiu o primário em 1925. Em 1927 vai cursar o ginasial no Atheneu Norte-Rio-Grandense em Natal, concluindo-o em 1931, e em 1932 ingressa na Universidade de Minas gerais onde se formou em Ciências Jurídicas pela Faculdade de Direito de Belo Horizonte colando grau em 1936 aos 25 anos de idade.
Morando em Belo Horizonte e já Bacharel em Direito, em 1938 escreve e publica seu primeiro romance de sucesso, “Os Brutos”, aplaudido pela melhor crítica literária da época no Rio de Janeiro e Minas Gerais. Durante a estadia na capital mineira, leva uma vida boêmia, trabalhando de amanuense em repartição pública onde muitas vezes chegava atrasado e até faltava no trabalho, pois costumava parar no trajeto para apreciar os jardins floridos e as mulheres que passavam na praça. Frequentava a Academia de Letras e escrevia para jornais da época. Nesta época se envolve com política e é preso pela ditadura Vargas acusado de envolvimento com os comunistas, fato nunca comprovado. Sua dedicada mãe, dona Veneranda vai até o palácio do Catete no Rio de Janeiro e de joelhos, suplica ao presidente pela libertação do seu filho e Getúlio Vargas lhe atende às súplicas libertando-o. Com a descoberta da scheelita do seu tio Tomaz Salustino, as coisas melhoram e em 1943 retorna com a família para Currais Novos onde serviu amplamente a gente da sua terra atuando na política e investindo na cultura, pesquisando e valorizando as expressões e os elementos da cultura, do folclore, da História e das tradições do lugar. Em 1944 escreve e publica o seu segundo romance: “ Por que não se casa, Doutor?”
Apesar de ser membro efetivo da OAB ( Ordem dos Advogados do Brasil), o Dr. Bezerra Gomes pouco ou quase nunca atua na advocacia, porém em 1946 ele se destaca num célebre processo de causa civil defendido em Lisboa-Portugal em favor dos herdeiros de dona Maria Germana Freire, caso sobre o qual a mídia potiguar fizera bastante alarde na época. De volta de Portugal sofre um acidente em Natal, desmantela a perna, mas durante a convalescença, aproveita e termina de escrever o seu terceiro romance: “ A Porta e o Vento” que só será publicado em 1974. Já de volta a Currais Novos, nesta nova etapa da sua vida como pesquisador descobriu, registrou e valorizou muitas expressões culturais locais como cantadores de viola, entrevistou Miguelão, matador de onça ( Miguel Augusto dos Santos) e descobriu Bastos dos Bonecos ( Sebastião Severino Dantas, de Nova Palmeira-PB) a quem muito incentivou, valorizou e levou ao Primeiro Congresso Brasileiro de Folclore no Rio de Janeiro, organizado por Cecília Meireles, com a presença do presidente Getúlio Vargas e do folclorista Câmara Cascudo, apresentando a tese: “ O Brinquedo de João Redondo” neste mesmo evento em 1951. Dessa época é que vem o seu grande amigo, o fotógrafo Raimundo Bezerra, que cuidava em registrar em fotografias tudo o que ele queria. Foi vereador de 1948 a 1953 e fez várias ações de incentivo à educação e a cultura do município: realizou o Primeiro Congresso Folclórico do Seridó com apoio do prefeito Dr. Silvio Bezerra de Melo; incentivou a realização das Atividades Artísticas junto à infância e à juventude; criou o Diretório de Documento e Cultura da Prefeitura de Currais Novos; abriu uma Biblioteca Pública; iniciou o museu e instalou um serviço de Radiodifusão e o Cinema junto com Oto Soares e Oscar Flamengo.
Permaneceu continuamente em Currais Novos de 1946 a 1968 e apesar de estar confinado no interior do estado toma parte ativa com a intelectualidade vigente e as atividades culturais do Rio Grande do Norte e do país. Participa de instituições e eventos, assina jornais e revistas importantes da época, se comunica por cartas com personalidades da cultura e da intelectualidade; torna-se membro do Instituto Genealógico Brasileiro sediado em São Paulo, membro do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte; ajuda a fundar a Academia Potiguar de Letras em Natal em 1956 e em 1957 é eleito para ela ocupando a cadeira número 07 em homenagem ao Prof. Angione Costa e, para sua surpresa, em 1963, por indicação disputa com Guimaraes Rosa uma vaga na Academia Brasileira de Letras, perdendo para o eminente escritor mineiro. Isto não o desanima e continua a escrever.
Tempos depois após o agravamento de problemas de saúde mental em 1968 vai morar definitivamente em Natal e a partir de aí alterna-se com temporadas em Currais Novos. A estas alturas morando na rua dos Pajeús, no Alecrim, levava uma vida pacata, não se metia mais em política, mas lê muito que é o que mais gosta de fazer nas horas vagas. Nunca casou nem teve filhos e sua mãe dona Veneranda é sua mais fiel e leal companheira, a cuidadora amorosa em todas as horas, ela, católica muito devota e piedosa que está sempre pronta a cuidar do filho mesmo nas horas mais adversas da vida. Dela é que ele herda a devoção que expressou numa tela intitulada: “ Nossa Senhora da Piedade”, que pintou numa terapia durante tratamento em Natal. A pintura fez sucesso numa exposição de Artes em Natal. Plantou uma muda de Pau Brasil no jardim da sua casa, onde imaginava ter sido ali o lugar de uma tribo indígena. Em 1974, por incentivo da Fundação José Augusto, cujo presidente era Diógenes da Cunha Lima, publica seu único livro de poesias, a “ Antologia Poética”.
Com o agravamento da doença, a gagueira crescente, aumenta suas crises psíquicas, cresce o preconceito e a discriminação sobre ele em Currais Novos e mesmo na capital potiguar, nos fins década 1970 já se encontra esquecido. A esta altura abandonara toda e qualquer atividade intelectual e literária: não lê, não escreve, quase não se comunica, só fala, visivelmente preocupado na doença e numa cirurgia que teme e terá de fazer. Abandonado, pouquíssimos amigos e admiradores o visitam, o poeta está só, com sua única e fiel companheira: dona Veneranda, sua mãe. Mesmo a classe de escritores e artistas não mais o procuram. Um dos poucos que o visitam é Anchieta Fernandes e Tarcísio Gurgel que indignado com o ostracismo a que o relegaram tece observações críticas questionando: “ Quem tem medo de José Bezerra Gomes? Que terá feito o poeta seridoense para merecer o duro ostracismo em que hoje vive? (…) Mas, e os amigos? Os poetas não o visitam? … por que não procuram saber como ele está? Por que não o assistem? Por que não o reverenciam? (…) O poeta está doente e só. Apenas dona Veneranda está presente e sua clara figura é confortadora para José Bezerra Gomes (…).”
Morreu o escritor, poeta e romancista José Bezerra Gomes numa quarta-feira, dia 26 de maio às 14h30, em 1982 na Rua Dr. Barata, Natal-RN, vítima de parada cárdio-respiratória, hipertensão arterial e infarto. Foi enterrado no cemitério Parque em Natal na manhã de quinta-feira, mas em julho de 1994 por ocasião da festa de Sant’Anna foi feito o traslado dos seus restos mortais para Currais Novos, no Cemitério Público de Sant’Anna, onde repousa na terra que o viu nascer e que honrou em suas obras.
Mas é pelo que escreveu que o José Bezerra Gomes entrou para a História do Rio Grande Norte, do Seridó e de Currais Novos. E ele escreveu de tudo um pouco, literatura, poesia, conto, romance, novela, história, folclore, genealogia, artigos, ensaios, biografias, discursos, cartas etc. Dentre a sua vasta produção escrita destaco aqui as seguintes obras:
Romances e Novelas:
– Os Brutos – 1938
– Por que não se casa, Doutor? – 1944 –
– A Porta e o Vento – 1974
Conto:
– João Arruma as Malas – ( na obra: Contistas Norte-Rio-Grandenses organizada por Nei Leandro de Castro)- 1966
Poesia:
– Antologia Poética – 1974
Folclore:
– Teatro de João Redondo – 1951
História:
– Sinopse do Município de Currais Novos – 1975
Biografia:
– Retrato de Ferreira Itajubá – 1944
Biografia e Genealogia:
– Retrospectiva da Vida do Presidente Tomás de Araújo Pereira
Dentre toda a sua produção escrita as que mais destaque têm na Literatura potiguar são suas obras de ficção e sua poesia. Ovacionado por grandes críticos literários como Câmara Cascudo, Moacy Cirne entre outros, foi classificado como um grande marco da poesia de vanguarda do Rio Grande do Norte. É, porém, o maior romancista e o poeta maior do Seridó potiguar e um dos maiores romancistas e poetas do Rio Grande do Norte. Seu romance: “Os Brutos” tivera destaque no ano de seu lançamento em 1938 sendo ovacionada pela crítica literária do Rio de Janeiro, de Belo Horizonte e pelo país afora. Recebeu elogios, incentivos e comentários de grandes nomes da literatura brasileira como: Graciliano Ramos, Jorge Amado, Menotti Del Picchia, Afonso Arinos de Melo Franco entre outros mais. No Geral a sua obra gira em torno do contexto da contonicultura no Seridó da década de 1930, onde o algodão mocó era o ouro branco do Sertão, fazendo a riqueza dos fazendeiros e o meio de vida dos trabalhadores das lavouras, muitas vezes chamados de brutos como mostrado na obra “ Os Brutos”. Em “A Porta e o Vento” aborda o contraste entre a vida da cidade e do campo, obra cheia de reminiscências da infância do autor repleta de afeto telúrico a terra, a casa da fazenda onde nasceu e viveu a infância com suas vivências campestres, rudes e simples de menino do campo ao lado dos avós. Já o livro: “Por que não se casa, Doutor?”, este foge à regra: não trata da cotonicultura, nem do torrão nativo e ainda se passa em terras longínquas: em Minas Gerais, Belo Horizonte onde o poeta viveu quando estudante da faculdade de Direito e onde ingressou na Literatura com seu primeiro romance. Tem muito de autobiográfico também advindo das vivências dessa época. Por fim o seu último livro literário “Antologia Poética”, publicado em 1974 e que traz uma enxurrada de lirismo também repleto de manifestações de amor à terra, com expressões saudosistas e ternas de afeto telúrico ao torrão, à família, aos avós, as vivências e tradições dos sertões do Seridó.
Viva José Bezerra Gomes!
Por: Damião Silva
Fontes: “ Calendário Histórico Potyguar e Seridoense” – Adauto Guerra Filho/ “ Centenário de José Bezerra Gomes ” – Joabel Rodrigues de Souza.