Elos Possíveis entre Geografia e a Literatura de Cordel ∗
Antonio Heleonarde Dantas de Medeiros ∗∗ Virgínia Célia Cavalcante de Holanda ∗∗∗
Geografia e Literatura de Cordel: trilhando suas práticas e possibilidades em sala de aula é uma proposta de trabalho que resultou de uma pesquisa, amadurecida e realizada durante a formação acadêmica em Geografia, mas germinada ainda na infância. A pesquisa envereda pelos folhetos, que retratam e edificam a historicidade de nossa região, lida, discutida,sentida, compreendida e revelada num universo simples, criativo e sem véu. Mergulhar nesse universo cordelista, é interpretar as formas de falar as lágrimas de um povo, povo do qual fazemos parte. Apesar da Literatura de Cordel nos últimos anos, ser um tema bastante estudado e discutido no meio acadêmico, com teses defendidas em diferentes áreas, pouco aparece nos trabalhos de Geografia. Não sabemos por qual motivo, apenas procuramos estabelecer um elo entre o cordel e a prática pedagógica em geografia, e os dois nos apontam que esse relacionamento profícuo. Para a construção desse artigo, nos detemos as questões que fomentam a compreensão da origem da literatura de cordel e seu conceito, em seguida identificamos os elos entre diferentes cordéis e o trabalho em sala de aula; seus encantos, suas abordagens, suas múltiplas possibilidades de gerar a utilização de outros recursos, etc.;
Palavras chaves: Literatura de Cordel – Geografia– Região – Nordeste
Pesquisa desenvolvida como requisito a obtenção do título de Licenciado em Geografia∗ Licenciado em Geografia pela Universidade Estadual Vale do Acaraú/UVA (CE),Especialista Em Educação Ambiental e Geografia do Semiárido pelo Instituto Federal do Rio Grande do Norte/IFRN∗∗ Professora Doutora da Universidade Estadual Vale do Acaraú/UVA (CE)∗∗∗
1. ORIGEM DA LITERATURA DE CORDEL
A geografia escolar vem passando por inúmeras transformações nos seus aspectos científicos nas últimas décadas, refletindo consequentemente em inovações no campo da Geografia que se Ensina. No entanto nos parece que a saída de uma Geografia Tradicional demasiadamente descritiva e sem importância no que consiste a compreensão do mundo para uma Geografia Crítica comprometida com a leitura real do mundo, parece ter sido mais rápida do que muitos professores e alunos pudessem alcançar, afinal foram muitos anos de silêncio. (STRAFORINI, 2006) A literatura popular impressa e a sistematização da geografia, tiveram suas origens no continente europeu, no entanto a literatura popular nasceu no século XV, bem antes da elaboração do pensamento geográfico, que ocorreu em fins do século XVIII na Alemanha tendo como um de seus precursores; Frederic Ratzel. A literatura popular com formas semelhantes ao nosso folheto começa a ser publicada após o advento da imprensa por volta de 1450. Segundo (LUYTER, 1992, p.30), “se iniciam na França em 1483, as primeiras impressões de poemas populares”. Troyes uma cidade situada a 150 quilômetros de Paris ficou famosa por publicar folhetos e almanaques populares por cerca de quatrocentos anos. Os livretos de Troyes recebiam o nome de Bibliotèque Bleue (Biblioteca Azul) devido à cor da capa do livreto, eram feitos em forma de poesia e idêntico ao nosso cordel, existiam ainda os colportage impressos em prosas ou mistos. (LUYTER, 2005), revela que na Inglaterra a literatura popular era escrita em verso e prosa e começou a circular logo após a instalação das primeiras gráficas no país, tinha o nome de ballads (baladas) e broad sides (lado largo), eram feitos para cantar e era impresso só de um lado do papel, se estendeu por todos os países de colonização britânica. A forma semelhante ao nosso folheto existiu também na Holanda e Alemanha, nessa última sendo ilustrados com xilogravuras e vendidos em Universidades.
Segundo (SILVA, 2001), a literatura de Cordel chegou à Península Ibérica no século XVI, na Espanha recebeu o nome de Pliegos Sueltos e em Portugal, o nome Folhas Soltas ou Volantes. Com a expansão mercantilista dentro do processo de colonização a literatura popular se espalha mundo a fora, conservando algumas especificidades e incorporando outros aspectos.
1.1 CORDEL: Entendendo seu Conceito
No tempo que Leandro Gomes de Barros o maior poeta de folhetos, era vivo, não se falava em Literatura de Cordel no Brasil, o nome Cordel não era bem aceito pelos poetas de bancadas que preferiam chamar de poesia popular. Sabe-se que o nome cordel provém de Portugal, onde os folhetos eram pendurados em barbante ou cordão. O certo é que o nome Cordel se popularizou e hoje é difícil fugir dessa denominação. O Cordel segundo o francês Raymond Cantel é a “Poesia narrativa, popular, impressa.” Sendo assim, o Cordel nada mais é que a narração de temas e assuntos populares feitas em forma de poesia rimada, impressa em folhetos. É imprescindível lembrar que o cordel, como cita Manoel Monteiro, exímio cordelista paraibano, no folheto Quer Escrever um Cordel? Aprenda Fazer Fazendo, “o cordel para ser bem feito tem que se enquadrar em três regras básicas, possuir em suas estrofes: Rima, métrica e oração”.
O dramaturgo, professor e escritor paraibano Ariano Suassuna, autor de O Auto da Compadecida, baseou-se em três folhetos de cordel para construir a sua obra mais conhecida. Ele tem uma afinidade com os folhetos e defende que o cordel ultrapassa as barreiras da impressão: Mesmo que não haja cordel nenhum, ainda que não se imprima o folheto, seja apenas uma quadra picaresca dessas que a gente sabe por aí à toa, mesmo que jamais impressa, o gênero é cordel. A minha opinião é que a palavra cordel vai para além do simples almanaque popular de poesia pendurado num barbante. Cordel é a poesia popular, impressa ou não. O dicionário Aurélio Eletrônico define o Cordel como sendo “Romanceiro popular nordestino, em grande parte contida em folhetos pobremente impressos e expostos à venda pendurados em cordão, nas feiras e mercados”. Dessa forma nota-se que não são todos os cordéis que saem em formas de folhetos, existindo uma certa quantidade que não é impressa. A internet hoje é uma grande ferramenta de divulgação da Literatura de Cordel, encontra-se sites especializados no assunto, à disposição dos interessados, disponibilizando as poesias de Cordel e vendendo os folhetos através da rede. Dentro desse contexto o professor de Geografia ao trabalhar com o Cordel precisa conhecer esses aspectos ligados a cultura popular, pois não é simplesmente trabalhar com o cordel elaborado, pronto e acabado. Se faz necessário contextualizar os autores, as normas básicas para sua confecção, as temáticas de interesse do grupo a partir das questões desenvolvidas em sala, deve-se aguçar a sensibilidade dentro do grupo com o qual se está trabalhando, saber como o mesmo define o papel de si mesmo num trabalho com cordel, pois deve existir alunos que apresentam maior identidade com essa literatura, outros são bons leitores de cordel, outros fazem a xilogravura, etc.
1.2 Temáticas geográficas e outros saberes: o que poetizam nossos vates?
A literatura de cordel, ao longo dos anos, desempenha um papel importante na cultura nordestina. Por muitos anos ela foi o jornal do sertanejo, sendo em algumas décadas o único meio de comunicação existente. Envolvendo criativamente ao abordarem saberes históricos e geográficos. Assim, os autores de folhetos de cordel trabalham ao longo dos anos mostrando para o sertanejo, os mais variados temas e acontecimentos ocorridos no Nordeste brasileiro ou em qualquer parte do mundo dependendo do assunto e interesse da classe consumidora. Muitas vezes fortalecendo o discurso das elites que coloca o Nordeste como vitima de uma exploração externa em outras tantas vezes tira o memória do exílio e o véu que encobre aexploração do Nordeste por essas elites. Acontecimentos políticos como: as mortes de presidentes ou suas campanhas vitoriosas mereceram inúmeros títulos de cordéis. Rodolfo Coelho Cavalcante vendeu milhares de folhetos quando publicou “A Chegada de Getúlio Vargas no Céu e Seu Julgamento”; não foi diferente com o poeta José Soares que escreveu “A Morte de Juscelino Kubitschek”; Na vitória do candidato petista Luis Inácio Lula da Silva, o poeta Léo Medeiros publicou o folheto: “O Que o Povo Quer do Governo Lula”; O cordelista Antonio Klévisson Viana intitulou seu folheto com o nome: “A Grande Vitória de Lula o Brasil Sem Medo de Ser Feliz”. Esses folhetos são ferramentas para o professor de Geografia que está discutindo a questão ligada ao uso diferenciado do território brasileiro. Pode se lançar mão desses folhetos dentro de uma leitura comparativa dessas figuras políticas. Pois representam o imaginário popular sobre governantes que marcaram ações no que consiste as políticas públicas em momentos distintos. O nacionalismo desenvolvimentista de Vargas, o nacional desenvolvimentismo e a SUDENE de KUBITSCHEK e mais recente o Brasil da política neoliberal e da esperança de LULA DA SILVA. Por ser o Nordeste uma região que possui grande parte de seus moradores adeptos ao catolicismo, os folhetos de cunho religioso sempre foram editados e vendidos não só em feiras, mas, em romarias e procissão que funcionavam como balcão de vendas. Padre Cícero é um dos personagens mais retratados na literatura de cordel, Manoel D’Almeida Filho no início da década de 70 do século XX, escreveu o folheto que ainda hoje é editado pela Editora Luzeiro: “Padre Cícero, O Santo do Juazeiro”; Natanael de Lima assinou o folheto: “O Encontro de Frei Damião com Padre Cícero no Céu”; Leandro Gomes de Barros escreveu um de seus maiores clássicos “História de João da Cruz”; e Patativa do Assaré escreveu o folheto “O Padre Henrique e o Dragão da Maldade”. As descrições elaboradas nesses folhetos sobre homens que se tornaram ícones da igreja católica, revelam a religiosidade de um povo, seus sonhos, sua fé, sua solidariedade, seus medos, enfim oportuno para o professor de Geografia trabalhar questões ligadas as Diferenças Regionais no que consiste a cultura. Fazer pesquisa junto aos Alunos sobre o contexto político, social e econômico em que foi escrito esses cordéis. Trabalhar ainda a construção dos mitos como a figura do padre Cícero no Nordeste brasileiro. Inúmeros são os folhetos que tratam do cangaço, alguns merecem destaque na literatura de cordel: “A Chegada de Lampião no Inferno”, do poeta Alagoano José Pacheco da Rocha; Antonio Silvino, escrito por Leandro Gomes de Barros; “A Chegada de Lampião No Céu”, obra de Rodolfo Coelho Cavalcanti; “O Encontro de Lampião Com Antônio Silvino”, do poeta pernambucano José Costa Leite; e “Os Cabras de Lampião”, do poeta paraibano Manoel D’Almeida Filho. Aqui o enfoque regional nas aulas de Geografia pode enveredar pela a discussão da gênese do que se convencionou chamar de Nordeste, pois segundo o geógrafo (LACERDA, 2002); até o inicio do século XX, o Nordeste era visto até pela imprensa sulista que se sentia europeizada, como uma só unidade juntamente com a Amazônia, formando o Norte, onde seus habitantes viviam envolvidos em meio a lutas duras, em busca de um salvador, onde a figura mais conhecida era a do cangaceiro. Ele afirma ainda: “Era o Nordeste o território com menos estrangeirismo em seu modo de ser e de sentir”, e isso naquele momento era motivo de vergonha e não de originalidade. Então trazer cordéis com esses temas é oportunizar o aluno a conhecer a formação territorial Nordestina por diferentes olhares. É quebrar mitos e entender como eles são construídos ainda no presente. Quanto aos folhetos que retratam o sistema econômico do Brasil, em sua ampla maioria são editados no período que o país passa por graves crises financeiras. O poeta e xilógrafo José Costa Leite editou: “Tudo Agora Levantou”; Severino Cândido Carolino escreveu: “A Carestia Solando O Pobre”; Léo Medeiros escreveu o folheto: “Dessa Vez Subiu Foi Tudo”; e João Lucas Evangelista editou o cordel: “O Sufoco do Real”. Esses folhetos contemplam a percepção do povo sobre a miséria que os atingem diretamente dentro do sistema capitalista, os deixando mais miseráveis, mostram suas formas inventivas de sobrevivência. Em sala de aula é uma oportunidade para discutir a divisão do trabalho e o olhar das pessoas comuns sobre o que não entendem pelos discursos dos economistas, mas que pagam o preço dentro de uma sociedade multifacetada. .
Existem folhetos que tratam dos acontecimentos esportivos ou discussão sobre o futebol. Vários folhetos foram publicados no ano de 1970, em virtude da seleção brasileira de futebol ter conquistado a sua terceira copa do mundo, sediada no México. Cabe aqui fazer registros dos cordéis mais conhecidos: “Tricampeão do Mundo”, de Manuel D’Almeida Filho; “Tricampeão do Mundo” de Rodolfo Coelho Cavalcante e “Brasil campeão do Mundo: A Copa do Mundo em Foco” do poeta José Soares. Aqui no estudo da região pode se lançar mão das discussões sobre as rivalidades entre as torcidas no presente, quando se trata da questão do futebol, comparando com as rivalidades religiosas entre os países por questões religiosas, ou de interesses econômicos. Está presente também a análise da força do futebol no processo de constituição dos lugares nas periferias das grandes cidades. Dependendo de outros recursos o professor de Geografia pode entrar num debate sobre a questão da construção da identidade, de gênero, de classe social, pelo víeis do esporte, percebendo como a mídia trabalha isso. Pode fazer ainda uma retrospectiva de como o futebol era visto e feito no passado e como é no presente, discutindo a questão da cultura de massa, etc.;
A literatura de cordel conta, inclusive, a vida dos cordelistas, repentistas, cantadores de viola. Exemplo disso são os folhetos editados sobre: As Pelejas. São cordéis que narram duelos entre dois violeiros, a maioria desses embates é fruto da imaginação do cordelista como é o caso de: “Peleja de Cego Aderaldo com Zé Pretinho do Tucum”, do poeta piauiense Firmino Teixeira do Amaral, cunhado de Cego Aderaldo; “Peleja de Manoel Riachão com o Diabo”, do poeta Leandro Gomes de Barros. No ano de 2003 os cordelistas cearenses Klévisson Viana e Rouxinol do Rinaré lançaram o folheto: “A Grande Peleja Virtual de Klévisson Viana e Rouxinol do Rinaré”, realizada através da internet. Esses embates podem embasar o professor para incentivar a criatividade dos alunos, podendo dividir a sala em grupo, onde esses grupos podem pegar uma discussão no campo geográfico e defender sua posição usando a literatura de cordel.
No campo da discussão sobre região, um bom trabalho é um embate sobre as regiões brasileiras e seus aspectos, atividade que envolve pesquisa, argumentação, leitura, interpretação, etc.; As histórias de amor também povoavam a mente dos cordelistas. Os livretos de Cordel quando são compostos por uma quantidade de trinta e duas páginas ou mais, recebem o nome de romance. A maioria deles são histórias de amor enfocando as dificuldades de casais apaixonados para vencer a barreira da cor ou classe social imposta por uma das famílias. Os romances de cordel penetravam nos lares nordestinos igualmente a telenovela de hoje. Nos sítios e fazendas as pessoas se amontoavam regadas à luz da lamparina para ouvir uma pessoa alfabetizada ler ou cantar um romance. O romance do “Pavão Misterioso” escrito pelo paraibano José Camelo de Melo Rezende é um dos mais vendidos e conhecidos da literatura de cordel, não se sabe a quantidade oficial de quantos exemplares foram vendidos desde sua criação em 1904. A problematização na sala de aula na disciplina de Geografia, desses folhetos que exploram a luta pelo amor, pode ocorrer através das questões sobre os diversos tipos de preconceito e da falta de cidadania que ocorre no presente, sobretudo o preconceito contra o pobre. Se revelando no espaço geográfico através da falta de acesso aos bens básicos, como; moradia, trabalho, circulação, educação, etc.;
Vários cordéis foram escritos abordando o tema valentia, a maioria deles são reeditados atualmente pela Editora Luzeiro e Academia Brasileira de Literatura de Cordel. Destacamos aqui alguns que encontramos facilmente no mercado:‘’História do Valentão do Mundo’, do pernambucano Severino Milanês da Silva; ‘João Acaba Mundo e a Serpente Negra’, obra do baiano Minelvino Francisco da Silva; e a ‘História do Valente Vilela’, editada por João Martins de Ataíde. Entre esses folhetos em debates ligados as discussões sobre as diferenças entre austeridade, violência, poder, justiça etc.; Existe uma grande quantidade de folhetos enquadrada no gênero de astúcia e gracejo, são obras que o poeta popular cria um personagem astuto, inteligente, sabido para tirar vantagem de reis, fazendeiros, autoridades em geral. Nota-se a habilidade que o cordelista tem, para colocar no papel contos e anedotas já conhecidos da literatura oral.
Muitos desses folhetos trazem personagem e história diferente embora com o mesmo sentido. Destacamos os seguintes folhetos: “As Perguntas do Rei e as Respostas de Camões”, obra do pernambucano Severino Gonçalves de Oliveira; “As Proezas de João Grilo”, do poeta João Ferreira de Lima; “Piadas de Bocaje”, de Antonio Teodoro dos Santos; “O Contador de Mentira”, do poeta Hélio Cavanaghi; “As Palhaças de Pedro Malazarte”, do paraibano Francisco Sales Areda; “Vida e Testamento de Cancão de Fogo”, personagem criado por Leandro Gomes de Barros; e “Aventuras de João Desmantelado”, do cearense João Lucas Evangelista. A criação desses personagens mais uma vez traz a tona as formas como o povo pobre tem no seu imaginário alternativas para enfrentar os desafios do mundo, eles viajam na história desses personagens, para isso é necessário sensibilidade. Aqui uma boa atividade para a Geografia, deve envolver entrevistas com os leitores desse tipo de cordel. Eles conhecerão mais o universo dessas pessoas e seus lugares.
A literatura de Cordel tem uma soma abundante de folhetos editados que tratam de temas sobre biografias. Muitos artistas, cientistas, políticos dentre outras personalidades já serviram de tema para os poetas de bancadas. O presidente da Academia Brasileira de Literatura de Cordel, Gonçalo Ferreira da Silva formado em Letras, cearense do Ipu-CE, a muito tempo morador do Rio de Janeiro já vendeu mais de um milhão de folhetos em três continentes, é mestre em escrever biografias dos grandes pensadores. São de sua lavra os seguintes folhetos biográficos: “Mahatma Gandhi”; “Arquimedes o Maior Sábio da Antiguidade”; “Galileu Galilei Vida e Obra”; “Aristóteles Vida e Obra”; “Sócrates Canalizador Maior do Pensamento Cristão”; “Pitágoras A Escola e os Seus Destinos”; dentre outros. Merece destaque outros folhetos que tratam de pessoas famosas: “Joana D’Arc A Heroína da França”, escrita pelo poeta pernambucano Delarme Monteiro Silva, “História, Vida e Morte de Luiz Gonzaga”, obra do sergipano João Firmino Cabral; e “Capitão Carlos Lamarca o Guerrilheiro do Brasil”, obra do paraibano João Dantas. Essas biografias rimadas são interessantes por não escolherem as figuras pela sua classe social, mas por aquilo que consideram grandes feitos para um grupo maior de pessoas, muitas delas são pessoas do povo, são folhetos ricos para de uma forma simples se introduzir um tema mais complexo. Não podemos falar da reforma religiosa sem conhecer o que a igreja fez com figuras como Joana D’arc. Já pensou começar o estudo de introdução ao pensamento geográfico lendo Aristóteles e Sócrates em folhetos? E como deve ser interessante abordar a cultura da paz e a questão da guerra começando com um folheto de Gandhi.
Enfim como os cordéis se atualizam, para dar conta da leitura do mundo no presente, fazendo lembrar a Geografia Crítica. Quando o Brasil passa a mostrar o predomínio da população urbana sobre a rural, apresentado oficialmente no censo de 1970. Essa inversão fez com que a literatura de cordel que até então, tratava de temas como cangaço, princesas encantadas e aparecimentos de bichos, mudasse para temas urbanos voltados para os problemas sócio-espaciais que são muito ricos para as temáticas geográficas. Essa produção ao trazer a tona tais problemáticas mais uma vez mostra como esses artistas estão em sintonia com as questões que afligem o cidadão comum, simplificando fatos no que consiste a compreensão ao modelo do freguês. Ao mesmo tempo em que auxilia aquele que precisa adentrar no universo mais complexo dessas questões, como é o caso da Educação formal que precisa trabalhar com conhecimentos científicos, mas pode começar (re) significando conceitos através desses folhetos. O poeta paraibano Manoel Monteiro, que há pouco teve um filme mostrando o seu trabalho incansável para botar o folheto em sala de aula, coloca muito bem o papel do novo cordelista. Com tantos problemas existentes no nosso país, quem possui o dom da criação como o poeta popular, não pode escrever apenas de brincadeira sem está antenado com o que passa em sua volta.
A quantidade de folhetos que aborda as questões sócio-espaciais é significativa. Vejamos alguns: “A Cartilha do Povo”, do cordelista paraibano Raimundo Santa Helena; “A Peleja de São Paulo Com o Monstro da Violência”, parceria de Téo Azevedo e Klévisson Viana; “Arranca Rabo em São Paul”o, do poeta Jotabarros; “As Eleições e as Promessas”, escrita pelo poeta Jotabê; “Clamando Por Justiça! A Luta de Uma Comunidade Contra a Invasão da Carcinicultura”, obra de José Edson de Sousa e “Contra o Bicho da Miséria a União Faz a Força”, obra de João Neco Filho, cearense de Uruoca
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A escolha dos temas geográficos pode partir do cotidiano do aluno, da sua vivência, do seu entorno para a compreensão global, ou seja, sem perder de vista a totalidade. “Um tema deve ser capaz de suscitar debates, levantar questões, despertar preocupações, recuperar a tradição e vislumbrar o futuro”. Temas atuais como: Globalização, Êxodo Rural, Urbanização, Movimentos Sociais do Campo, Meio Ambiente, Problemas Ambientais, Analfabetismo, Desigualdades Sociais, Racismo, Preconceito, Consciência Política, dentre outros, se forem bem trabalhados nas oficinas, contribuirão para a formação política do aluno assim como na descoberta de novos cordelistas. Entretanto (PINHEIRO, 2001, p.98), diz: “É sempre bom lembrar que atividade de criação em sala de aula deve ter um caráter lúdico, favorecendo a livre expressão do aluno e jamais ser usada de modo obrigatório e para fins avaliativos” O educador da área de Geografia que se enveredar nas leituras de folhetos de cordel, encontrará um vasto manancial de obras, podendo usá-las com abordagens geográficas distintas. Do autor Antonio Gonçalves da Silva (Patativa do Assaré), temos vários poemas que podem ser trabalhados na área como: A Triste Partida, ABC do Nordeste Flagelado, Emigrações e as Conseqüências, porém vale ressaltar, que grande parte da obra de Patativa é voltada para as questões sociais, abordando diversos temas como: Seca, êxodo rural, latifúndio, consciência política, analfabetismo, miséria, dentre outros. Pouco desse material saiu em folheto, mas hoje seus livros são facilmente encontrados no mercado e com um preço acessível. Podemos citar também o trabalho do poeta paraibano Chico Pedrosa, radicado atualmente em Pernambuco, com obras que se encaixam perfeitamente com os temasgeográficos. Na Contramão do Dever, O Santo Protetor, Sertão Independente e Cidadania Ferina. Esses folhetos em sala de aula instigarão debates. Justamente por essas discussões que o professor Zé Hilton Pinheiro, que leciona em Campina Grande e utiliza os folhetos como recurso para-dídatico, diz:: “Acredito no cordel na sala de aula por ser um instrumento de reconstrução”.14 O cordelista Manoel Monteiro, com mais de duas centenas de folhetos editados possui várias obras que merecem uma análise geográfica, são elas: Holocaustos dos homens Nus, Nova História da Paraíba, Campina do Meus Amores, Viagem a Baixa da Égua dentre outras. Essa última em parceria com o escritor cearense Arievaldo Viana. O poeta popular Zé Laurentino, reside em Campina Grande-PB, tem uma produção muito rica, na área social destacam-se as obras: Conversa de Passageiro, A Carta de Matuto.
Dentro desse contexto o ambiente da escola pode revelar a riqueza da Literatura de Cordel no entendimento da realidade, mostrando também as dificuldades encontradas pelos cordelistas, na publicação e divulgação de suas obras.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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HOLANDA, V. C. C. Modernizações e Espaços seletivos no Nordeste Brasileiro. Sobral: conexão lugar/mundo. Tese (Doutorado em Geografia Humana) Departamento de Geografia da FFLCH da USP. São Paulo. 2007.
LUYTEN, M. J.O Que é Literatura Popular. São Paulo: Brasiliense, 1992. 5ª edição, 74p.
LUYTEN, M. J.O que é Literatura de Cordel. São Paulo: Brasiliense, 2005.
PINHEIRO, H. Cordel na sala de aula. São Paulo: Editoras duas cidades, 2001.
SILVA, G. F. Vertentes e Evolução da Literatura de Cordel. Rio de Janeiro: Milart, 2001.
STRAFORINI, R. Ensinar geografia: O desafio da totalidade-mundo nas séries iniciais.2 ed. São Paulo : Annablume, 2006. 188 p.
SUASSUNA, A. O Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e Volta-romance armorial-popular brasileiro. Rio de Janeiro: José Olympio, 1971.